segunda-feira, 5 de novembro de 2007

O Coração das Trevas


Após o seu avião cair em território inimigo, em plena guerra do Vietname, o tenente Dieter olha em volta para apenas encontrar selva. Ela rodeia-o por todas os lados: vegetação luxuriante e selvagem… bela, mas mortal. Quando ele a vê, sabe que está perante o maior adversário que alguma vez o Homem enfrentou: a Natureza. Esta imagem de “Rescue Dawn” é uma reminiscência de “Aguirre, The Wrath of God”, um clássico que influenciou toda uma geração de cineastas e acaba por estar na origem de filmes como “Apocalypse Now”. Há dois grandes motivos para mergulhar no negro universo de Werner Herzog (um dos mais proeminentes cineastas alemães): o seu tratamento lírico das paisagens que filma e o seu retrato da natureza humana na sua luta com o meio que a rodeia.

As imagens assombrosas da enorme selva do Laos, acompanhadas pelo som da música erudita de Klaus Badelt, traduzem-se em momentos inesquecíveis para o espectador. Infelizmente, são cenas curtas, adaptadas a um cinema mais dinâmico e moderno. É pena, pois nunca seria demais tentar recriar cenas com a beleza da “overture” de “Kaspar Hauser”. Para completar o retrato está Carl Dieter, o aviador que no Laos, terá de sacrificar toda a sua humanidade para fugir a um campo de prisioneiros para onde é levado, e sobreviver, sem meios, na selva. Christian Bale constrói a sua personagem de forma exemplar, conseguindo personificar todo o martírio físico e psicológico que Dieter sofreu; Bale emagreceu diversos quilos, comeu lagartas e serpentes e teve o seu corpo coberto de sanguessugas. Tudo isso, enquanto mantinha um ar tresloucado e face de desalento. Não admira que Herzog o tenha escolhido como “sucessor” de Klaus Kinski.

“Rescue Dawn” é a oportunidade perfeita para recuperar um dos maiores cineastas de sempre. É uma pujante história sobre a sobrevivência e uma cruel viagem ao coração das trevas, com um lirismo audiovisual digno do adjectivo “poético”.

Por Rui Craveirinha.

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